30 março 2007

fala o liturgista

Todos que se interessam pela liturgia da Igreja se perguntam se o Santo Padre lançará logo um motu proprio permitindo a celebração da "Missa Antiga", e (se ele o fizer) o que [o motu proprio] dirá. Um dos liturgistas do Vaticano esclarece os planos do Papa:

ANTHONY VALLE: Excelência, o senhor foi generoso em dar várias entrevistas à imprensa internacional desde que V. Excia. se tornou Secretário da Congregação para o Culto Divino. Algumas de suas declarações foram mal interpretadas e suscitaram controvérsias ao invés de fornecerem a clareza pretendida. Há algo que o senhor gostaria de esclarecer?


ARCEBISPO MALCOM RANJITH: Aquilo em que eu quis insistir nessas entrevistas foi que a reforma pós-conciliar da liturgia não foi capaz de atingir os objectivos almejados de renovação espiritual e missionária na Igreja, de modo que hoje pudéssemos estar verdadeiramente contentes com ela.

Indubitavelmente, houve resultados positivos também; mas parece que os efeitos negativos foram maiores, causando muita desorientação em nossas fileiras.
As igrejas esvaziaram-se, o auto-direccionamento litúrgico tornou-se a ordem do dia, e o verdadeiro sentido e importância daquilo que é celebrado foi obscurecido.
É preciso, então, começar a se perguntar se o processo de reforma realmente foi manejado de maneira correta. Por isso, precisamos olhar bem para o que aconteceu, rezar e reflectir sobre as suas causas e, com o auxílio do Senhor, prosseguir com as correcções necessárias.


VALLE:
Parece que o Papa Bento XVI vai lançar um motu proprio para liberalizar o uso da Missa tradicional, ou tridentina. Alguns esperam que o motu proprio do Papa institua uma estrutura jurídica que permita aos sacerdotes celebrar a Missa tradicional sem serem injustamente perseguidos e persistentemente frustrados por, ironicamente, não pessoas de outros credos nem autoridades seculares, mas por seus próprios pastores e bispos. Essa esperança por um novo aparato jurídico é realista? Um tal aparato é necessário?

Mons. RANJITH: Bem, há um clamor crescente pela restauração da Missa Tridentina. E mesmo certas figuras de proa da elite fizeram apelos públicos por essa Missa nalguns jornais recentemente.

Tenho certeza de que o Santo Padre levará isso em consideração e decidirá o melhor para a Igreja.

O senhor fala da possível realização de novas estruturas jurídicas para a implementação de tais decisões. Não penso que isso seja muito problemático. Pelo contrário, o que é mais importante em tudo isso é uma atitude pastoral.

VALLE: Será que os bispos e padres rejeitarão os pedidos pela Missa Tridentina e, assim, criarão a necessidade de estruturas jurídicas para garantir que seja cumprida uma decisão do Papa? A coisa deveria ir por esse caminho?

Mons. RANJITH:
Eu sinceramente espero que não.

A questão adequada que os pastores devem fazer a si próprios é:

Como posso eu, como bispo ou padre, trazer ainda que uma só pessoa para mais perto de Cristo e de Sua Igreja?

Não é tanto uma questão da Missa Tridentina ou do Novus Ordo. É apenas uma questão de responsabilidade e sensibilidade pastoral.


VALLE: Portanto, a Missa Tridentina sendo o meio de alcançar um nível ainda maior de enriquecimento espiritual dos fiéis, os pastores então deveriam permiti-la.

Mons. RANJITH: A preocupação importante é não tanto o "quê", mas o "como". A Igreja deveria sempre ajudar nossos fiéis a se aproximarem do Senhor, a se sentirem desafiados por Sua mensagem e a responderem generosamente ao Seu chamado. E se isso pode ser alcançado por meio da celebração da Missa Novus Ordo ou da Missa de Pio V, bem, então é preciso dar espaço àquilo que for melhor, ao invés de descer a desnecessárias e divisoras subtilezas teológicas. Coisas desse tipo precisam ser decididas com o coração e não tanto com a cabeça.

Afinal de contas, o Papa João Paulo II fez um apelo pessoal, na Ecclesia Dei Adflicta, de 1988, aos bispos, convocando-os a serem generosos nessa questão, com aqueles que desejam celebrar ou participar de uma Missa Tridentina. Além disso, precisamos recordar que a Missa Tridentina não é algo que pertence somente aos seguidores do Arcebispo Lefebvre. É parte de nossa própria herança como membros da Igreja Católica.

O Concílio Vaticano II, como declarou tão claramente o Papa Bento em seu discurso aos membros da Cúria em Dezembro de 2005, não vislumbrou um recomeço total [a totally new beginning], mas um de continuidade com um renovado sentido de entusiasmo e uma nova perspectiva que melhor respondesse às necessidades missionárias da época.

Ademais, também temos a questão séria do número decrescente de fiéis em algumas das igrejas no mundo ocidental. Precisamos nos perguntar o que aconteceu nessas igrejas e, então, tomar as medidas correctivas que forem necessárias. Não acredito que esta situação possa ser atribuída somente à secularização. Uma profunda crise de fé, unida a um impulso de novidade e experimentação litúrgica sem sentido, tiveram seu próprio impacto nessa questão. Há muito formalismo e intrepidez visíveis, às vezes.

Por isso, precisamos recuperar um verdadeiro sentido do sagrado e místico no culto.
E se os fiéis sentem que a Missa Tridentina lhes oferece esse sentido do sagrado e místico mais do que qualquer outra coisa, então precisamos ter a coragem de aceitar seu pedido.
Quanto à data e natureza do motu proprio, nada se sabe ainda. É o Santo Padre quem decidirá.

E, quando o fizer, nós todos devemos, em toda a obediência, aceitar o que ele nos indicar e, com um genuíno amor pela Igreja, nos esforçar por ajudá-lo. Qualquer atitude contrária apenas feriria a missão espiritual da Igreja e frustraria a própria vontade do Senhor.


VALLE: Como muitos Católicos hoje, minha esposa e eu temos notado que saímos da celebração da Missa Novus Ordo de domingo exasperados e perplexos, ao invés de espiritualmente revigorados. Por quê?


Mons. RANJITH: Na celebração do Novus Ordo precisamos levar muito a sério aquilo que fazemos no altar. Não posso ser um padre que sonha, quando dorme, com o que farei na Missa do dia seguinte, depois ando até o altar e começo a celebrar com toda espécie de acções e rubricas novas e criadas por mim mesmo.

A Santa Eucaristia pertence à Igreja. Por isso, tem um significado próprio que não pode ser deixado às idiossincrasias do celebrante individual.

Cada um dos elementos na liturgia da Igreja tem sua própria longa história de desenvolvimento e significância. Certamente não é uma questão de "tradições" particulares, e, por isso, não pode ser objecto de manipulação por todos.

Na verdade, a Sacrosanctum Concilium afirma que, além da Sé Apostólica e dos bispos, e nesse último caso isto é permitido a estes por aquela, "absolutamente nenhuma pessoa, nem mesmo um sacerdote, pode acrescentar, remover ou alterar qualquer coisa por sua própria autoridade" (SC 22). Ainda assim, notamos muito auto-direccionamento em questões litúrgicas em algumas áreas da Igreja hoje, basicamente em decorrência de uma compreensão inadequada da teologia litúrgica.

Por exemplo, o mistério da Santa Eucaristia tem sido frequentemente mal entendido, ou apenas parcialmente entendido, deixando assim a porta aberta a todo tipo de abusos litúrgicos.

Na celebração da Santa Eucaristia, alguns põem excessiva ênfase no papel presidencial do sacerdote. Mas nós sabemos que o sacerdote, na verdade, não é o principal agente daquilo que acontece sobre o altar.

É o próprio Jesus.
Além disso, toda celebração litúrgica também possui uma dimensão celestial "que é celebrada na cidade santa de Jerusalém rumo à qual nos encaminhamos como peregrinos" (SC 8).

Outros explicam a Eucaristia de um modo que põe a ênfase na dimensão banquete/ceia, ligando-a à "comunhão". Também essa é uma consideração importante, mas devemos nos lembrar de que não se trata tanto de uma comunhão criada por aqueles que participam da Eucaristia: sobretudo, trata-se do próprio Senhor.

Por meio da Eucaristia, o Senhor nos assume em Si Mesmo e n'Ele somos postos em comunhão com todos os outros que se unem a Ele. É portanto uma experiência não tanto sociológica, mas sobretudo mística. Logo, mesmo como "comunhão" a Eucaristia é uma experiência celestial.

O que é mais importante é a dimensão sacrifical da Eucaristia. Cada vez que celebramos a Eucaristia, nós revivemos o sacrifício do Calvário, celebrando-o como o momento de nossa salvação.

E esse próprio fato também constitui a dignidade singular e a fonte da identidade do sacerdote. Ele foi instituído por Cristo para celebrar o maravilhoso mistério da transformação desse pedaço de pão corruptível no próprio Corpo glorificado de Cristo e desse pouquinho de vinho no Sangue de Cristo, actualizando o sacrifício do Calvário para a salvação do mundo. E isso precisa ser vivido, entendido e acreditado pelo padre cada vez que ele celebra a Eucaristia.

Na verdade, a Sacrosanctum Concilium enfatizou a efectividade sacrifical e salvífica da Missa. O sacerdote assim se torna outro Cristo, por assim dizer. Que grande vocação! E assim, se celebramos a Eucaristia devidamente, então os fiéis colherão um imenso benefício espiritual e voltarão de novo e de novo em busca desse alimento celestial.

VALLE: Alguns defenderam que a solução para a crise litúrgica -- e no fundo para a crise da fé -- que aflige a Igreja Católica, hoje, seria implementar o uso exclusivo da Missa Tridentina, enquanto outros sustentam que só precisamos de uma "reforma da reforma", noutras palavras, uma reforma do Novus Ordo. Qual o parecer de Vossa Excia.?

Mons. RANJITH: Uma atitude de "ou isto, ou aquilo" polarizaria desnecessariamente a Igreja, ao passo que a caridade e a preocupação pastoral é que deveriam ser os factores motivantes.

Se o Santo Padre assim quiser, ambas as coisas poderiam coexistir.

Isso não significa que teríamos de desistir do Novus Ordo. Mas, na interacção das duas tradições romanas, é possível que uma acabe influenciando a outra.

Não podemos dizer que tudo está completo ou terminado, que nada novo pode acontecer. Na verdade, o Vaticano II nunca advogou uma mudança imediata na liturgia. Preferiu, em vez disso, que a mudança "amadurecesse organicamente a partir de formas pré-existentes" (SC 23). Como o Cardeal Antonelli, um mui reverenciado membro do Consilium que fez a revisão da liturgia depois do Concílio, notou em seus diários, algumas das mudanças litúrgicas depois do Concílio foram introduzidas sem muita reflexão, de modo fortuito, e acabaram se tornando mais tarde prática aceita.

Por exemplo, a Comunhão na mão não foi algo que primeiro tenha sido adequadamente estudado e reflectido, antes de sua aceitação pela Santa Sé. Foi introduzida fortuitamente em alguns países norte-europeus e, mais tarde, tornou-se uma prática aceita, disseminando-se finalmente por muitos outros lugares. Ora, essa é uma situação que deveria ter sido evitada. O Concílio Vaticano II jamais advogou uma tal abordagem à reforma litúrgica.


VALLE: Lex orandi, lex credendi, lex vivendi ("A lei da oração (é) a lei da crença, (é) a lei do modo de viver"). É verdade que o modo como cultuamos e rezamos influencia aquilo em que acreditamos, e que aquilo em que acreditamos influencia o modo como vivemos? Noutras palavras, a liturgia influencia, em última instância, nossa vida moral, não é mesmo?


Mons. RANJITH: Sim. Como é que podemos convencer os fiéis a fazerem sacrifícios em suas opções éticas ou morais, sem que antes eles sejam tocados e inspirados profundamente pela graça de Deus? E isso acontece especialmente no culto, ocasião em que a alma humana pode vivenciar a graça salvífica de Deus do modo mais íntimo. No culto, a fé se torna interiorizada e transborda com inspiração e força, o que torna possível fazer as escolhas morais que estão em consonância com a fé. Na liturgia, devemos vivenciar a proximidade de Deus em nosso coração de modo tão intenso que nós, por nossa vez, passemos a crer com fervor e sejamos compelidos a agir com justiça.


VALLE: Quais são algumas das tendências ou problemas litúrgicos contemporâneos que precisam ser corrigidos?


Mons. RANJITH: Um deles, como vejo, é a tendência a substituir a Missa dominical, em alguns países, por liturgias ecuménicas, durante as quais líderes leigos católicos e ministros protestantes celebram juntos, e os últimos são convidados a pregar a homilia. As Liturgias da Palavra dominicais com a distribuição da Santa Comunhão, forma permitida quando um sacerdote não tem como estar presente, pode passar aos fiéis o sinal errado se forem transformadas em eventos ecuménicos. Eles podem acostumar-se à ideia do domingo sem a Eucaristia.

A Eucaristia, como o senhor sabe, faz a Igreja (EdE. 21) e isso é central para nós, Católicos. Se for tão facilmente substituída por Liturgias da Palavra, ou ainda pior, pelos assim chamados serviços ecuménicos de oração, a própria identidade da Igreja Católica estaria em questão. Infelizmente, também ouvimos falar de casos em que a própria Eucaristia está sendo celebrada sob diversos disfarces juntamente com pastores protestantes. Isso é totalmente inaceitável e constitui um graviora delicta ("gravíssima ofensa") (RM 172).

O ecumenismo não é uma coisa deixada à escolha improvisada [ad hoc] dos padres individualmente. O verdadeiro ecumenismo, tal como aquele esposado pelo Vaticano II, vem do coração da Igreja. Por exemplo, o caminho para o verdadeiro ecumenismo começa com a reflexão séria da parte daqueles que são julgados competentes para participar desse tipo de reflexão, como o Pontifício Conselho para a Unidade Cristã e o próprio Santo Padre. Nem todo mundo tem a competência para saber de que modo essa delicada busca pela unidade deve ser percebida. Isso requer muita reflexão e oração. Portanto, a inovação litúrgica em nome do ecumenismo não deveria ser tentada por iniciativa individual.

Uma segunda tendência perturbadora é a gradual substituição da Missa celebrada pelo sacerdote por um serviço para-litúrgico conduzido por uma pessoa leiga.

Claro que isso pode acontecer legitimamente quando não há nenhum padre disponível, e quando locais para o cumprimento da obrigação dominical são raros. O que é perigoso é marginalizar o padre mesmo quando ele está disponível, e algum líder leigo de equipe pastoral se arroga tarefas que são reservadas aos padres. Falo da tendência de fazer com que o líder leigo pregue a homilia em vez do padre, mesmo quando este está presente, ou distribua a Santa Comunhão, deixando o padre sentado ociosamente perto do altar.

Precisamos destacar aqui que, como afirmou o Concílio Vaticano II, o sacerdócio comum dos fiéis e o sacerdócio ministerial "diferem um do outro em essência e não somente em grau" (LG 10). E, portanto, é um abuso grave relegar ao laicato as obrigações sagradas reservadas ao padre.

O que é lamentável é a crescente tendência, no mundo todo, de laicizar o padre e de clericalizar o laicato. Isso também é contra mentem ("contra a mente" ou "contra a intenção") do Concílio.

Há também uma tendência crescente a mudar a Missa dominical para os sábados quase que como prática "normal". Em vez de o domingo ser o verdadeiro dia do Senhor, e, portanto, um dia de repouso espiritual e físico, há um movimento para a redução de sua importância, fazendo com que se torne um dia de distracções mundanas.

Na Dies Domini, o Papa João Paulo II alertou contra essa tendência perturbadora
Uma última coisa que eu gostaria de destacar aqui diz respeito a algumas práticas introduzidas em territórios de missão, por exemplo, na Ásia, em nome da mudança, que são contrárias ao seu património cultural.
Em alguns países asiáticos, vemos uma tendência a introduzir a Comunhão na mão e comunhão recebida de pé. Isso não é em nada compatível com a cultura asiática. Os budistas cultuam prostrados no chão, com sua testa tocando o solo. Os muçulmanos tiram os sapatos e lavam os pés antes de entrarem na mesquita para o culto. Os hindus entram no templo de peito nu como sinal de submissão. Quando as pessoas se aproximam do rei da Tailândia ou do imperador do Japão, elas o fazem de joelhos, como sinal de respeito. Acontece que em muitos países asiáticos a Igreja introduziu práticas como apenas curvar-se levemente para o Santíssimo Sacramento em vez de ajoelhar, receber a Santa Comunhão de pé, e receber a Comunhão na mão. E nós sabemos que todas essas práticas não podem ser consideradas compatíveis com a cultura asiática.
Além disso, o laicato, cujo papel vem sendo hoje aumentado na Igreja, nem é consultado quando tais decisões são tomadas.

Todas essas situações não são de bom augúrio para a Igreja e precisamos corrigir essas tendências, se for para a Eucaristia que celebramos tornar-se, como afirmou Santo Inácio de Antioquia, "remédio de imortalidade e antídoto contra a morte" (Eph. 20).

Anthony Valle é um teólogo e escritor que mora em Roma.

estatísticas...

A evidência está nos factos. Palavras para quê?

Padres em exercício:
1965 - 58.000
2002 - 45.000

Ordenações:
1965 - 1.575
2002 - 450

Paróquias sem padre:
1965 - 549 (cerca de 1%)
2002 - 2.928 (cerca de 15%)

Seminaristas:
1965 - 49.000
2002 - 4.700

Freiras:
1965 - 180.000
2002 - 75.000

Frades:
1965 - 12.000
2002 - 5.700

Jesuítas:
1965 - 5.277
2002 - 3.172

Franciscanos:
1965 - 2.534
2002 - 1.492

Christian Brothers:
1965 - 2.434
2002 - 959

Redentoristas:
1965 - 1.148
2002 - 349

Colégios Católicos:
1965 - 1.566
2002 - 786

Estudantes de Colégios Católicos:
1965 - 700.000
2002 - 386.000

Escolas Paroquiais:
1965 - 10.504
2002 - 6.623

Estudantes de Escolas Paroquiais:
1965 - 4,5 milhões
2002 - 1,9 milhões

Baptismo de Crianças:
1965 - 1,3 milhões
2002 - 1 milhão

Baptismos de Adultos (conversões):
1965 - 126.000
2002 - 80.000

Casamentos Católicos:
1965 - 352.000
2002 - 256.000

Anulamentos:
1965 - 338
2002 - 50.000

Presença Regular à Missa - estudo no.1:
1958 - 74% dos Católicos (pesquisa Gallup)
1994 - 26.6% (estudo da Notre Dame)

Presença Regular à Missa - estudo da Fordham University:
1965 - 65% dos Católicos
2000 - 25%

Vários (fonte: National Catholic Reporter)
77% acreditam que os Católicos não precisam de assistir à Missa aos Domingos
65% acreditam que os Católicos se possam divorciar e casar novamente
53% acreditam que os Católicos possam fazer abortos
10% acreditam no ensinamento da Igreja com relação ao controlo de natalidade (fonte: pesquisa da Notre Dame)
70% acreditam que a Eucaristia seja uma "lembrança simbólica" de Nosso Senhor (pesquisa da New York Times)
Nota: O Concílio Ecuménico Vaticano II decorreu de 1962 a 1965.

28 março 2007

dai a Deus o que é de Deus!

Venha o que vier no Motu Proprio (ouve-se dizer que a liberalização da Missa Tridentina é certa e será "obrigatória" onde houverem 30 assinaturas de fiéis...), o que é certo é que a oposição existe e tem sido forte. Às vezes penso que isso pode dividir a Igreja e causar uma crise... Rezo para que tal não aconteça.
Desde Outubro que circulam rumores do tal Motu Proprio e desde Outubro que muitos tremem só de ouvir falar em latim. O episcopado de França, bem como o da Alemanha e Itália demonstram medo deste rito de Missa. Porquê? Parece que ela irá deitar abaixo todo o Vaticano II... Terá, realmente, esse poder?
Há ainda outra questão, como irá a Igreja reagir ao publicamento oficial do Motu Proprio?
Todos os últimos documentos do Vaticano foram recebidos com bastante indiferença, tanto do episcopado como dos fiéis. E o Motu Proprio? Como será recebido? Talvez faça a capa de muitos jornais, principalmente com os Bispos a dizerem que "o Papa é antiquado" ou "que não quis dizer exactamente aquilo", nem sequer obriga. A ver vamos...
É pouco provável, e temos de ser realistas, a reacção prática ao Motu Proprio vai ser pequena. Os padres e fieis que desejam a liturgia em rito tridentino são pouco numerosos se comparados com os que perderam o interesse por ela. Serão precisos muitos esforços para a recolocar em toda a Igreja, no seu lugar de honra.
Acredito que leve o seu tempo, arrancará lentamente, mas crescerá, principalmente quando começarem a surgir novos santos e a redescobrir-se as riquezas e a beleza desta liturgia perdida. A Missa de Paulo VI não tem hipóteses contra a Tridentina. Não é possível comparar a imensidão da Tridentina com a protestante actual!
O Motu Proprio vai matar todo o ecumenismo, liberalismo e o espírito do mundo que mancha a Santa Igreja. Sim, vai! A separação vai voltar. A Igreja celeste afastar-se-á da Terra. Ou se é de Deus ou do mundo! Esta separação será para breve!

Motu Proprio prontinho!!!

O Motu Proprio, bem como a sua carta de apresentação aos bispos, estão prontos, diz-nos o jornal Die Welt.
Em França, os prelados deram oposição ao Santo Padre, o que realmente atrasou tudo. Consta por ai que os Franceses tentaram mostrar a Bento XVI que a Missa Tridentina é e será um erro... De que terão eles medo?
Por sua vez, o Cardeal Castrillon Hoyos confiou a um amigo: "o Papa está muito decidido".
Diz o jornal La Stampa que até à Páscoa deve sair o Motu Proprio.
Na Audiência de hoje, dia 28 de Março, Sua Santidade, no meu ponto de vista, deu dicas para o Rito Tridentino:
Irineu, não se limita à definição do conceito Tradição. A sua tradição, a ineterrupa Tradição, não é tradicionalismo, porque a Tradição é eternamente vivificada pelo Espírito Santo, que a faz viver outra vez, a interpreta e a inclui na vitalidade da Igreja.
Rezemos e confiemos...

26 março 2007

má vontade

As reacções da opinião pública à Exortação Apostólica de Bento XVI são de todos os modos e feitios. Eu fico sempre feliz quando encontro um novo comentário!
Estes senhores dos media ficam logo encantados quando vem algo do Vaticano que inclua as palavras: "casamento padres", "divorciados comungar", "missa latim", "gregoriano", "violas e tambores", "etc".
E eu respondo com uma palavra: Ignorância ou então "seus malandros que quereis enganar o povo à moda das seitas que retiram palavras soltas...".
Os do grupo dos ignorantes, coitadinhos, comentam com base em comentários. Não leram sequer o texto. Concerteza nem repararam ainda que o título da Exortação são as primeiras palavras da mesma (como é costume nestes documentos, salvo erro).
Deixo aqui bem claro: o Papa não disse para se voltar ao latim. Pediu aquilo que o Vaticano II pede: não esquecer a língua latina, principalmente nas grandes celebrações - como Fátima, onde se ouve o latim...
Também não pediu homilias em latim, como eu li e ri no DN... aliás, há um ponto na Exortação que diz algo do género "com excepção das leituras, homilia e oração dos fieis..."
Apesar disso, creio que o Santo Padre vai trazer de volta a beleza do latim a celebrações mais pequenas. É a língua universal da Igreja! Sabendo latim, todos se entenderão em qualquer ponto do mundo, sem a barreira da língua. Aguardemos...
Quanto ao celibato, casamento e companhia, o Santo Padre, mesmo que quisesse (ele não quer), nunca iria contra a decisão de um Concilio. Penso eu...
Acrescento que o Santo Padre, como diziam uns modernistas, está a voltar à Igreja pré-concilio. Quando os seminários estavam cheios, as igrejas cheias, quando se respirava o religioso nos conventos, quando era bom e agradável entrar numa igreja.
São Bento, rogai por nós e pela Santa Igreja verdadeira e fiel aos ensinamentos do Senhor.

25 março 2007

diz o El Pais:

"A Exortação Sacramentum Caritatis ajusta-se ao espírito programático do pontificado. O Papa considera que décadas de relaxamento católico permitiram a promulgação de leis "socialmente corrosivas", e exige um cerrar fileiras. Quer ele que a Igreja não se definem pelo número de fiéis mais ou menos teóricos, mas pela qualidade, consciencialização e activismo dos mesmos. Para ele, o catolicismo deve reflectir-se da mesma forma no silêncio da reflexão prévia à eucaristia e no fragor dos debates públicos. O termo "inegociável", aplicado a questões como o aborto, a eutanásia, o divórcio, as uniões homossexuais ou o ensino católico, resulta significativo. O cerrar fileiras vem junto com um certo retorno a valores pré conciliares, como a missa em latim e o canto gregoriano, preferíveis, segundo a Exortação, às missas em língua local e aos acompanhamentos musicais mais ou menos modernos. A lembrança de que os católicos divorciados e casados de novo não podem receber a comunhão, e que devem esforçar-se para compensar sua situação irregular com "penitências e obras de caridade", complementa um quadro ao mesmo tempo retrógrado e, em um sentido político, "revolucionário". (El País, Madrid, 14-03-2007 artigo de Enric González, correspondente em Roma).

14 março 2007

diz um modernista:

O documento Sacramentum Caritatis não é outra coisa senão o definitivo selo papal à Restauração. O Sumo Pontífice – Bento XVI – reafirmou que “os políticos e legisladores católicos” não devem votar leis contrárias à “natureza humana”. Isto é o fim do Concílio Vaticano II.


E foi assim que no ano da graça de 2007 foi colocada a pedra tumular sobre o Concílio Vaticano II, para cujo sepultamento há anos já se havia cavado a fossa. A Exortação pós Sinodal Sacramentum Caritatis, publicada hoje, não é senão o selo definitivo de Bento XVI à grande Restauração.

Um processo iniciado sob o pontificado wojtyliano, votando ao degredo, através da Missa, todas as opções progressistas internas do catolicismo (e a contemporânea benevolência para com as alas extremistas a começar pelos lefrebvistas), o crescimento excessivo de realidades “laicas” mais integristas de boa parte do clero (desde Comunhão e Libertação até a tentacular Opus Dei), em constante sufocamento das instâncias teologicamente mais avançadas, desde os padres mais corajosos, das batalhas sociais da África e na América Latina, da colegialidade episcopal. E a lista poderia continuar até o infinito.

O Papa João abriu a janela da Igreja, para “fazer entrar — ele mesmo o disse — "o ar fresco do mundo”. Seu sucessor alemão volta a fechá-la, sem hipocrisias e sem nem mesmo derramar sequer uma lágrima pela herança conciliar dissipada e pisoteada. Depois de pouco mais de 40 anos do fechamento do Concílio, podem se contradizer abertamente as constituições dogmáticas (e sublinhamos dogmáticas) de um Concílio Ecumênico, presidido por um Papa e composto por todos os Bispos do mundo? Isso se perguntam os que se têm como verdadeiros católicos, os que estão convencidos que o caminho para a situação atual só pode ter sido tomada desde os primeiríssimos anos 80, quando o mesmo Ratzinger foi chamado ao Santo Ofício. De fato, o Concílio aprovara a distinção entre o plano espiritual e o plano político temporal. “A comunidade política e a Igreja – estabelecia a Gaudium et Spes – são independentes e autônomas uma da outra em seu próprio campo”. Hoje, em vez, a ingerência é a norma.

O Papa se lança na Sacramentum Caritatis contra os Dico [os gays], reafirmando que "políticos e legisladores católicos conscientes de sua grave responsabilidade social" não devem votar leis que vão contra "a natureza humana". Um verdadeiro e próprio diktat universal (uma exortação pós sinodal tem natureza magisterial, e é obrigatória para todos os católicos). A Igreja se arroga o direito de estabelecer os programas políticos dos governos presentes e futuros, despojando os deputados católicos de todo vínculo com relação a seus eleitores, e em definitivo da comunidade política que os escolheu, e de fato manipulando-os em nome não do bem comum e da salvaguarda da pessoa, mas por motivo de (presumidas) verdades de fé. Os desventurados parlamentares católicos, ordena Ratzinger, devem "dar público testemunho da própria fé" na defesa da família, do matrimônio, em suma, da vida, em todos os “valores fundamentais ".

É o fim do sonho de tentar conciliar o catolicismo com os direitos individuais dos cidadãos, com a liberdade de consciência, com a autonomia da esfera política. Aqueles direitos confirmados (ou assim se esperava) por João XXIII na Pacem in Terris: "Em uma convivência ordenada e fecunda - escrevia Roncalli em 1963 – deve ser posto com fundamento o princípio que todo ser humano é pessoa, isto é, uma natureza dotada de inteligência e de vontade livre; e, portanto, é um sujeito de direitos e de deveres que brotam imediatamente e simultaneamente da sua própria natureza: direitos e deveres que são, por isso mesmo, universais, invioláveis, inalienáveis". Hoje, em vez, é colocado um verdadeiro e próprio ultimatum ao político católico: "Os valores fundamentais como o respeito e a defesa da vida humana" tem "um nexo objetivo com a Eucaristia". Traduzindo: se vocês votarem leis "erradas" não pensem mais em comungar. Um diktat gravíssimo, com o único precedente da excomunhão dos comunistas em 1949, em plena guerra fria, e, entretanto, muito freqüentemente ignorada. E depois, exatamente, não tinha ainda ocorrido o Concílio que estabeleceu a distinção entre erro e errante, definição caridosa de Roncalli que permitia manter firmes algumas convicções doutrinárias da Igreja sem por isso marginalizar os “pecadores”.

Uma bela lápide também sobre isso: os divorciados recasados, por exemplo, adverte Ratzinger, são um problema espinhoso, antes certamente uma "verdadeira chaga da atual contexto social", e não podem absolutamente ser admitidos aos sacramentos.

O Papa focaliza também sobre o problema da castidade dos padres, come é bem conhecido uma condição não dogmática mas apenas histórica, revista por todas as confissões cristãs exceto a católica: o celibato "é uma riqueza inestimável". E vacila também talvez a mais conhecida constituição conciliar: a da liturgia. Bento XVI deseja um retorno ao latim e ao canto gregoriano, desde sempre armas ideológicas dos nostálgicos de uma Igreja monárquica e tridentina. "Pois bem - escreve, referindo-se sobretudo aos grandes encontros internacionais - que tais celebrações sejam em língua latina; assim também sejam recitadas em latim as rações mais conhecidas pela tradição da Igreja e eventualmente executados trechos em canto gregoriano". E ainda, o convite a preservar o domingo, e aquele ainda da salvaguarda do papel da mulher. Um papel, bem entendido, que a enquadre rigorosamente em "seu ser próprio de esposa e de mãe".

Em suma, um verdadeiro e próprio manifesto contra reformista, alguma coisa similar á encíclica "Quanta Cura" de 1864, assinada por Pio IX. Frente a um mundo político tremente e incerto (e se era lícito esperar isso do centro direita, porém causa desagrado notar a mesma fraqueza estrutural no centro esquerda) a Igreja volta a ditar normas e comportamentos. Enterra com o Concilio, a grande tradição do catolicismo liberal, de Gioberti a Rosmini, de Manzoni a De Gasperi que se opôs à Operação Sturzo projetada por Pio XII. Objetivamente quebra a política italiana, constrangida a dilacerar-se sobre questões que em toda a Europa foram enfrentadas e largamente superadas (freqüentemente, como na França, por ações de governos de direita), e a fazer as contas entre quem é mais católico e que o é menos (e para quando se voltará a usar o termo "infiel"?).

Um documento, esta "Sacramentum caritatis", que não tem nada de caridosa, um documento gravíssimo, nos limites do crime. Chantagear um Deputado regularmente eleito, foi dito já, é contra a Constituição. É verdade. Mas, em nossa opinião, é muito mais grave o total deslocamento da Igreja para a direita, que assim se auto condena ao isolamento, se fecha na defesa da Verdade, e, numa época de confronto de civilizações oferece de si mesma uma imagem especular à do mundo islâmico. Não é por acaso que Ratzinger, há poucos meses atrás chegou a indicar, como exemplo a espiritualidade e a luta contra o relativismo vigentes em países maometanos.Os ferozes dardos que o Osservatore Romano lançou às manifestações gays têm as cores foscas da intolerância e do obscurantismo, e quem estava ali no sábado à tarde não esquecerá que a poucos metros, no Campo de Fiori, tinham brilhado os tenebrosos fulgores da fogueira para queimar Giordano Bruno. Agrada-nos, para não estragar o dia de muitos leitores, concluir usando as palavars do já citado Papa João, com a esperança que a Igreja volte a fazê-las suas: "Nada de condenações doutrinárias — disse falando do Concílio — hoje a Igreja prefere antes demonstrar a validade das suas doutrinas e fazer uso da medicina da graça".


Paolo Giorgi, APRILE Info On Line - "A grande intervenção"
MONTFORT Associação Cultural
http://www.montfort.org.br/index.php?secao=veritas&subsecao=igreja&artigo=grande_intervencao〈=bra
Online, 14/03/2007 às 20:38h

comentários

"A recomendação de rezar em latim e entoar canto gregoriano «faz sentido». Até podia ser em aramaico (a língua de Jesus). É uma transmissão do passado, o ritual faz parte da vida humana" by Peter Stilwell, padre católico (?).
"continua a restringir a possibilidade de celebrar aos celibatários; deixará de haver quem reparta o pão eucaristico
" by Frei Bento Domingos, frade católico (?).
Todas estas frases demonstram como certos católicos que rezam "creio na Igreja" não o são na verdade e mentem ao rezar o Credo...

01 março 2007

Tridentino

O Instituto Bom Pastor, órgão criado pelo papa Bento 16 com sede na Arquidiocese de Bordeaux, na França, tenta recuperar a tradição da Igreja Católica ao criar um órgão que pretende restituir a chamada missa tridentina --rito tradicional que é celebrado em latim.

O decreto de criação do instituto é de 6 de setembro deste ano, e permitirá que padres de todo o mundo não sejam mais subordinados ao Concílio Vaticano 2º, concluído pelo papa Paulo 6º (1963-1978), que instituiu o uso das chamadas línguas vulgares na liturgia católica.

A medida visava facilitar a compreensão dos ritos por parte dos fiéis.

A missa tridentina, também é conhecida como missa de Pio 5º (1566-1572), foi celebrada durante mais de 15 séculos. No entanto, o decreto papal não pretende excluir, a princípio, as missas nas línguas locais.

Como a América Latina tem as duas maiores comunidades católicas do mundo (Brasil e México), a igreja enviou o padre Rafael Navas Ortiz do Chile ao Brasil para discutir a instalação do instituto com lideranças católicas de São Paulo e, também, com fiéis simpatizantes à idéia.

Navas foi escolhido pelo padre Philippe Laguérie --superior geral do Bom Pastor nomeado pelo Vaticano-- para ser o superior distrital do instituto na América Latina.

Navas foi ordenado em 1984 pelo monsenhor Michel Lefebvre, cuja notoriedade se deve à insubordinação ao Concílio Vaticano 2º e que, em 1988, foi excomungado pelo papa João Paulo 2º ao ordenar quatro bispos sem sua autorização.

Em entrevista exclusiva à Folha Online, Navas discorreu sobre as razões do papa Bento 16 ao recuperar essa antiga tradição católica. Leia a íntegra da entrevista:

Folha Online - A Reforma Protestante se baseou, entre outros princípios, na tradução dos textos bíblicos para as chamadas línguas vulgares, pois seus idealistas consideravam os ritos católicos herméticos e inacessíveis ao povo. Ao restituir a missa em latim, a Igreja Católica não estaria afastando ainda mais os seus fiéis?

Padre Navas- Afastá-los mais é um pouco difícil, porque já estão bastante afastados. Ao mesmo tempo em que ocorria a Reforma Protestante, igual número pessoas se vinculavam à igreja, na América Latina, e não sabiam nem sequer o castelhano, como os indígenas, que massivamente, na mesma época, convertiam-se com esta missa. O latim dá garantia de identidade com o passar do tempo. As línguas vivas vão mudando. O latim não. No entanto, sempre existiram dentro da igreja os missários com a tradução para quem queria compreender a parte material. Mas o fundo do mistério da missa é incompreensível racionalmente. Por isso estava em presença nossa fé. Foi esta fé que os indígenas intuíram, compreenderam e aceitaram, e explicaram os grandes doutores da igreja. É esta fé que hoje falta ao mundo, que a compreensão material fez perder o sentido sobrenatural, espiritual, transcendente, que é o verdadeiro vínculo com Deus. Quando se tem uma visão puramente horizontal, pois se pode compreender todo o idioma, mas não se compreende o essencial. Daí deriva essa separação dos fiéis, que o próprio papa João Paulo 2º chamara de apostasia [afastamento dos caminhos de Deus] silenciosa. Um abandono da fé sem ruído, que leva a igreja a essas estatísticas de participação verdadeira dos fiéis nos últimos séculos. O latim dá garantia e identidade.

Folha Online - Então essa iniciativa do papa é de buscar uma aproximação de Deus com os homens mais pela via espiritual e menos pela racional?

Padre Navas - Sim, mas de uma maneira que a via racional seja iluminada pela via espiritual. Não se renuncia à razão, nunca. Ela deve ser iluminada pela luz sobrenatural da fé. Um reconhecimento da autoridade divina. O papa percebeu isso. O que está se perdendo no mundo é a necessidade do sagrado.

Folha Online - Afirma-se que o avanço das igrejas evangélicas se deve ao fato de elas estarem mais próximas das expectativas que as pessoas têm sobre Deus atualmente. Essa iniciativa da Igreja Católica tem como intenção conter esse avanço?

Padre Navas - As igrejas evangélicas avançam na medida em que a Igreja Católica retrocede. Não apenas em número de fiéis, mas também em número de igrejas, com subdivisões permanentes. Porque não têm unidade de fé. O papa quer restabelecer essa unidade de culto e corrigir todos os abusos. Por isso mesmo nos chamou. Para que nessa unidade de culto, manifeste-se essa unidade de fé, que não têm os protestantes, pois crêem no querem crer. Sua autoridade são eles mesmos. A preocupação do papa é a unidade da igreja em torno da fé. A criação do Instituto Bom Pastor é apenas um passo. O próximo passo será certamente a liberação de todos os sacerdotes que queiram celebrar o rito tradicional.

Folha Online - O papa considera, então, que, na medida em que a igreja se adaptou aos avanços tecnológicos, culturais e sociais do mundo nestes últimos 40 anos, ela retrocedeu, ao invés de igualmente avançar?

Padre Navas - O papa encontra, neste momento, circunstâncias próprias para continuar ensinando a doutrina. Dizia-se que o século 21 seria a civilização do amor e, no entanto, é de conhecimento público que este é o século do terrorismo. Estamos diante de um desafio, que é o paganismo reinante no mundo, da descrença cultural acelerada, que tem como conseqüência a apostasia silenciosa, como disse o papa João Paulo 2º.

Folha Online - As igrejas teriam liturgias mistas, com a missa em latim e, no caso do Brasil, em português, ou isso será um processo gradativo até a total implantação da missa tridentina?

Padre Navas - São duas coisas distintas. Uma é a liberdade que todo sacerdote terá de celebrar o rito dos últimos anos, e outra coisa é o que o papa chamou de "a reforma da reforma". Como ficará, em termos práticos? Não sabemos ainda. O que sei é que o Instituto Bom Pastor tem como rito próprio e exclusivo o rito tradicional da igreja. Quer dizer que não será permitido a um sacerdote do instituto celebrar a missa nova, de Paulo 6º. Isso, obviamente, não impede que, em determinado momento, o papa dê ordens para que se vá impedindo os abusos que se vêem por aí, em que há padres que fazem sua própria liturgia, criando, modificando a seu bel prazer.

Folha Online - E outras cerimônias, como casamentos e batizados? Também seriam feitos em latim?

Padre Navas - Sim, porque é um seguimento da via paroquial. O Instituto Bom Pastor tem como objetivo criar paróquias personalizadas no ritual tradicional.

Folha Online - E o ensino religioso?

Padre Navas - Permaneceria como sempre foi. Orientar a inteligência pela fé.

Folha Online- Porque o latim é a língua própria do catolicismo, sendo que filmes como "A Paixão de Cristo", por exemplo, mostraram que Jesus falava aramaico?

Padre Navas - A língua da igreja se estabelece com sede em Roma, e latim era a língua do Império Romano, o que permitiu a expansão da igreja por todos os domínios romanos. Ela serve como veículo de identidade da fé. Se você vir escrituras do século 5º, do século 17, do século 19 e de hoje, é sempre a mesma expressão. Faz com que não haja essa mudança que há, por exemplo, nas obras de Santa Teresa em castelhano antigo, que hoje, traduzidas, não se entende. O próprio decreto do Instituto Bom Pastor é em latim, com uma tradução para o francês. Mas há, na missa tridentina, passagens em hebraico e, também, em grego.

Folha Online - Há um outro aspecto da missa tridentina, que determina que o padre esteja de costas para os fiéis...

Padre Navas - Eu preferia dizer que é de frente para Deus. O padre conduz uma procissão de frente para Deus. Muitos historiadores --e os liturgistas concordam-- que a missa sempre se celebrou com o altar oriental. Em todas as catedrais medievais o altar central está voltado para o oriente. Há uma explicação pedagógica. No oriente nasce o sol. Dele vem a luz, e Cristo é a luz do mundo.

Folha Online - O papa considera que o Concílio Vaticano 2º foi um equívoco?

Padre Navas - O papa considera que, naquele momento, ele foi feito com uma intenção pastoral. Mas ele sustenta que o objetivo do Instituto Bom Pastor é fazer uma crítica construtiva dos ensinamentos doutrinais daquele Concílio, para que a igreja manifeste uma interpretação autêntica.

Folha Online - A igreja se afastou do povo ou o povo se afastou da igreja?

Padre Navas - A igreja tem como missão sempre conduzir o povo. Agora, se os homens da igreja renunciam à condução do povo, cria-se um vazio. E é forçoso reconhecer, muito lamentavelmente, que esse vazio que se criou foi preenchido pelas seitas, especialmente na América Latina. É necessário que a igreja retome sua ação pastoral e doutrinária.

Folha Online - Qual a outra importância da América Latina para a Igreja Católica, além do número de fiéis que possui?

Padre Navas - Todos os países são importantes para a Igreja Católica, mas na América Latina se encontram mais recursos humanos e uma cultura que não foi tão deformada quanto a européia e a norte-americana. Há mais elementos da cultura católica, que nos dão mais recursos humanos para a conquista do mundo. A Igreja Católica não renuncia à conquista do mundo para Deus, que é sua missão.

JAMES CIMINO da Folha Online a 17/11/2006